Ojan fala sobre rap, vivências, produção e participação em Cypher lançada com ícones da cena

por Gustavo Silva

No dia 05 de junho rolou um lançamento de muito peso na cena do rap nacional, a cypher Quebrada Rap Parte 1. Com produção da Cara Preta Records de Mauá (SP), e suporte da Straditerra, o som reuniu ícones da cena nacional como, Ojan, Dum-Dum (Facção Central), Funk Buia (Z’África Brasil), Preto Zika e Mc Menor da CK.

Abordando falas e falhas do contexto social, desigualdades e injustiças, e transmitindo a essência do rap nacional dos anos 90 a cypher trouxe a oportunidade de artistas consagrados no cenário nacional dividirem suas experiências com talentos em ascensão, unindo diferentes gerações e vivências na mesma track.

O lançamento veio acompanhado de um videoclipe rodado na comunidade da Lage em Mauá, ilustrando e ambientando a narrativa sonora com a atmosfera periférica de uma favela de São Paulo. O instrumental conta com a produção de Pablo Oliveira (P.O Beats), produtor mineiro que já assinou diversos trabalhos de destaque.

Para dissecar e aprofundar um pouco mais o significado e o contexto da produção dessa cypher, a Straditerra entrevistou Ojan, o rapper de 35 anos de São Lourenço (MG) que rompeu mais uma vez as fronteiras regionais e geracionais, e aperfeiçoou seu trabalho como produtor musical, compondo mais um lançamento de peso.

Jonathan Chaib, mais conhecido como Ojan, natural do bairro Carioca do município que compõe o Circuito das Águas, lançou em 2018 “Lugares e Dimensões”, seu primeiro álbum de estúdio com participações de grandes destaques da cena nacional como Froid, Dada Yute, Menestrel e Sombra.

O rapper mineiro não tem um nome desconhecido no cenário artístico e musical brasileiro. Consagrado por anos com uma trajetória internacional no reggae, o artista agora se destaca em carreira solo, invadindo a cena do rap nacional. E falou com a Straditerra sobre sua trajetória, seu mais recente lançamento e sobre toda a cena do rap nacional e regional.

Straditerra: Começar falando sobre o som mano. Tanto o seu quanto os versos de todos os outros mc’s na cypher trazem mensagens claras e fortes sobre o contexto violento da vida nas margens da sociedade, explorando desde o racismo e a violência da polícia, passando pelo genocídio da juventude e da população negra, principalmente nas favelas, chegando até a críticas mais contundentes ao governo federal. Levando em conta todas as lutas e questões que temos visto sendo debatidas no contexto do Brasil, e do mundo, neste momento, como você sente a mensagem e o significado que essa cypher busca trazer através da voz de todos esses mc’s?

Ojan: Então, esse projeto ele aborda diversos temas sociais que estão precisando ser abordados, serem falados, e todos os envolvidos vieram com esse grito de justiça primeiramente. E a gente vê a importância de músicas com este contexto, principalmente no universo do rap, que não é nada novo, o rap sempre vem com essa forma de confronto. E a gente aborda na letra situações que são faladas já há muito tempo, então prova a emergência que essas coisas precisam ser resolvidas, porque são temas já falados, são situações e guerras já vividas. Como o Dum-Dum fala nessa mesma música:

“Se isso aqui é uma guerra, a culpa é de vocês. Se a marcha fúnebre prossegue, a culpa é de vocês. A culpa é do sistema, e sempre será”.

A gente acaba falando aí de coisas que a gente já vem falando dentro da cena, dentro do movimento, pedindo por justiça principalmente, para o povo periférico. Então, é ainda mais importante neste momento que a gente tá vivendo, que muitas das coisas que estão faladas ali na letra encaixam com coisas que já aconteceram e coisas que a gente tá vivendo agora, contra esse fascismo, racismo, toda forma de opressão, vamos assim dizer. Então a principal mensagem que eu acredito que essa cypher traz é de justiça. É que as pessoas lembrem que tem muita coisa acontecendo perto delas às vezes, e que a gente faz vista grossa, porque são assuntos delicados, mas que precisam ser falados. E mais do que nunca a humanidade precisa acordar, tomar um sacode.

Straditerra: Esse lançamento te trouxe uma oportunidade de entrar em contato e trabalhar sua arte ao lado de ícones e referências do Rap nacional como o Dum-Dum e o Funk Buia, que tanto fizeram e continuam fazendo por toda a cultura hip hop. Como foi essa experiência para você, e como você sentiu essa oportunidade de conhecer, trabalhar e criar junto desses grandes nomes da música nacional?

Ojan: Mano, fechar parceria com esses monstros aí é máximo respeito, sem palavras mesmo. Sentimento inicialmente de gratidão, por tá na presença desses professores, e de responsa, né mano? É uma responsabilidade você escrever uma letra junto com esses caras assim que são referência, e sempre foram, pra mim principalmente, sempre escutei e tive como referência dentro da cena, e do movimento rap, tanto Z’África Brasil como Facção Central, e tá junto desses caras numa track é no mínimo aula, tá ligado? A vivência com eles, pessoalmente no estúdio, na gravação do clipe, você acaba aprendendo em tudo, na postura, enfim. E o melhor de tudo isso é que essas parcerias, principalmente no meu caso, acabam se estendendo em amizade, a maioria dos feats que eu já me envolvi acabaram se tornando meus amigos, mais do que só uma parceria musical. Então eu fico muito feliz e honrado por fazer parte disso, e de alguma forma tá colocando principalmente aí a nossa cena 35 cada vez mais dentro da cena nacional. E eu me envolvendo com esses manos naturalmente eles acabam conhecendo o trabalho de outros manos que fecham comigo, certo. E é isso, máximo respeito!

Straditerra: Sua recente trajetória nesta carreira solo como rapper já conta com uma lista de respeito de parcerias e contatos. No lançamento do seu álbum “Lugares e Dimensões” você também conseguiu partilhar da arte de outros destaques de um contexto mais contemporâneo do rap nacional, como Froid, Sombra, Dada Yute, Edgar, entre outros. Como você avalia esse seu caminho trilhado no rap até aqui?

Ojan: Então, eu sempre vivi o rap, sempre senti esse feeling, desde moleque escutei muito rap, sempre tive envolvido de alguma forma ali, perto, nos bastidores, com grupos e amigos, tal. Mas a minha vivência mais direta mesmo, como artista na cena rap é de pouco tempo, desde que eu vim agora com o meu trampo mais solo, que inicialmente ainda era mais new roots assim, um reggae mais estilizado, mas a minha aproximação com o rap mesmo como artista é de pouco tempo, foi realmente ali perto do lançamento do “Lugares e Dimensões”. E eu já consegui de uma certa forma me envolver aí com pessoas, grandes nomes da cena nacional, o que acarretou respeito como artista pra minha carreira, e ao mesmo tempo abriu ali horizontes, fez com que outras pessoas conhecessem meu trabalho, assim como outros artistas também. E eu sei que ainda tem muito caminho a trilhar nessa cena, é uma cena que eu tenho muito respeito então eu vou chegando de mansinho e tal, mas ao mesmo tempo eu boto pra frente, então eu sei que tem muito caminho a trilhar mas eu sou bem feliz e satisfeito com essas conquistas até o momento, principalmente por eu conseguir me envolver e ser aceito dentro na cena de uma certa forma, sendo, vamos dizer aí, apadrinhado, abençoado, por esses outros ícones que já tão aí fazendo pelo movimento. Então pra mim eu vejo essa caminhada como uma trajetória até aqui de conquistas, de certa forma bem-sucedida, porque todas as metas foram cumpridas. E fico feliz pela aceitação também que o disco teve, a gente sabia que era para ser um clássico mais do que ser um CD de hit e eu sei da importância que ele tem pra minha carreira e também pra nossa cena, pro nosso movimento e região, que colocou um artista da quebrada dentro da cena nacional. Então até aqui eu me vejo satisfeito por ter conseguido me envolver, representar nossa quebrada e ser aceito dentro do movimento nacional, por grandes nomes da nova e da velha geração do rap.

Straditerra: Falando um pouco agora sobre o seu trabalho como produtor. Nos créditos da cypher, Jonathan Ojan é listado como responsável pela mixagem e masterização do som. Como se desenvolveu essa sua atuação como produtor e como você alia sua arte e seu trabalho enquanto rapper, com a sua arte de produção?

Ojan: Nem sempre é tão fácil aliar as duas coisas, os dois trampos: produtor e artista. Mas eu gosto muito das duas, eu tenho prazer em produzir assim como tenho prazer em tá atuando. Então pra mim é sempre a maior vibe tá mixando, masterizando e tal. Quando eu tô envolvido no trampo é um pouco mais delicado, porque sou eu ali né mano, e é sempre bom ter outro ouvido quando você tá fazendo seu trampo, mas eu busco ser um pouco imparcial ali com o meu gosto e ser mais profissional com o que a técnica também pede. Enfim, cypher, projeto de cypher assim geralmente é um pouco mais delicado, mais difícil de executar porque são várias vozes, né mano, cada um tem um timbre, cada um tem uma pegada, uma intensidade, então mixar cypher assim é um bagulho bem louco, porque você tem que buscar ali uma harmonia entre todos os envolvidos. Mas é isso, eu busco sempre tá dando máxima atenção aos dois trampos, artista e produtor, e tentando ser o melhor possível nos dois âmbitos, dar o meu melhor como produtor e dar o meu melhor como mc também. E essa cypher em especial foi máximo respeito, porque tá ali também na parte técnica, mixando as vozes desses monstros, podendo ouvir na íntegra a voz do Dum-Dum, a voz do Buia, Preto Zika, Menor, geral os envolvidos ali é a maior aula, então a gente acaba aprendendo também como artista.

Straditerra: Pra fechar, após falar tanto das suas parcerias e oportunidades que teve em dividir trabalhos com grandes nomes do cenário musical brasileiro, quais são suas visões sobre o trabalho desenvolvido pelas novas gerações do rap nacional, e este forte crescimento da cena regional?

Ojan: Sobre essa nova geração do rap aí mano, vejo que ela vem com força total, tá ligado, a molecada tem muito gás, muita criatividade. Sei que o movimento também tá passando por uma carência de letras inteligentes, que abordam temas mais profundos e tal, mas isso também é uma questão de amadurecimento, de toda essa rapaziada que tá chegando, de se contextualizar, entender um pouco mais a militância do movimento. Mas de toda forma a gente vê uma expansão muito grande do rap, e querendo ou não essas outras formas de expressão, forma de escrita, de como abordar dentro do rap que tá surgindo, também vem abrindo outros horizontes, fazendo o rap chegar um pouco mais longe. E naturalmente as pessoas chegam, às vezes, através de uma parada que tá um pouco mais na moda mas depois acaba parando mais no profundo do que a gente tem a oferecer também, acaba conhecendo as raízes, então eu vejo que toda forma é de soma, tá ligado, contribui. Claro que é importante muita sabedoria nesse momento pra não deixar se perder também, pra não deixar perder a essência da parada, mas eu vejo também que tem muita gente ainda firme aí nessa militância, nessa essência, mantendo as raízes de pé. E sobre a nossa quebrada 35, e tudo o que tá acontecendo, vendo o crescimento da nossa cena eu fico muito feliz mano, fico muito feliz de saber que a parada tem muito talento, nossa quebrada tem muito talento, o que falta é visibilidade, e é exatamente o que a gente tá buscando, o que a gente tá vindo fazer, cada vez mais, atrair os olhares também pra nossa quebrada e mostrar esses talentos aí pro mundo, certo? E é isso, fico muito feliz de saber que tem vários artistas, produtores e coletivos que tão fazendo acontecer, assim como Straditerra, Falamemo, Movimento Reggae Sul Mineiro, enfim, vários mano aí, não vou ficar citando nome pra também não deixar ninguém de fora, mas todos que tão fazendo por onde a parada se manter firme, tá ligado, e eu muito mais honrado assim, feliz por saber que sou um grande contribuinte também pelo crescimento dessa cena.

A cypher Quebrada Rap Parte 1 está disponível no YouTube e em todas as plataformas de streaming.

Fotografias: Cara Preta Records

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